Faltam
pouco mais de dois meses para o início da Olimpíada de Londres. A tocha, que já
foi acesa na Grécia, vai percorrer o mundo e circular pelas ruas da capital
britânica até acender a pira no Parque Olímpico de Stratford, zona leste da
cidade.
Dentro
do estádio, 80.000 pessoas vão vibrar com a cerimônia de abertura enquanto, do
lado de fora, moradores, ex-moradores e ativistas vão denunciar a “limpeza” da
área, uma das mais empobrecidas do país, feita à base de políticas agressivas
de coerção e remoção de pessoas em favor do “benefício econômico”.
Dois
exemplos recentes, retratados pelo jornal britânico The Guardian e pela rede
estatal BBC, mostram como políticas públicas, aliadas à especulação
imobiliária, desfiguraram a zona leste de Londres. O primeiro revelou os
efeitos perniciosos da criação de “zonas de dispersão”, com o intuito de
facilitar abordagens e remoção de pessoas com “comportamento anti-social” da
área do Parque Olímpico. O segundo expôs a alta dos aluguéis na região e o
conseqüente aumento no número de despejos praticados por proprietários ávidos
pelo “dinheiro olímpico”.
Todos
os dados expostos pela imprensa britânica têm como fonte o Games Monitor ,
entidade responsável por investigar e apresentar relatórios sobre as
conseqüências dos Jogos Olímpicos para a cidade. A iniciativa, comparável à do
Movimento Nossa São Paulo, já demonstrou em documentos bastante detalhados,
compilados por voluntários, estudantes e especialistas, o crescimento no valor
dos imóveis do leste de Londres, a explosão nos preços dos aluguéis e a prática
de despejo.
Chama
a atenção, de acordo com a Entidade, como as práticas atravessam todo o
espectro político britânico desde que Londres foi selecionada para sediar a
Olimpíada. Novos Trabalhistas, liderados por Tony Blair, iniciaram o processo,
agora assumido e levado a cabo pelo conservadorismo de David Cameron . Ambos
sempre exaltaram os “benefícios” que a Olimpíada traria ao Reino Unido.
Regeneração
ou gentrificação?
A
zona leste de Londres, uma das áreas mais pobres do país, já foi laboratório de
pesquisa para o escritor Jack London, que resultou no best-seller “O povo do
abismo”, e para o sociólogo Friedrich Engels, que ainda em sua juventude
visitou o East End para escrever “A condição da classe operária na Inglaterra”.
Ambos são retratos do início do século 20 que, com nova dose de alarmismo dos
distúrbios do verão passado, povoam o imaginário londrino e engendram o
movimento de “regeneração” da área, encampado por governo e proprietários.
“Para
mim, a gentrificação (processo de exclusão econômica) é liderada pelos
proprietários, mas facilitada por planejadores e tomadores de decisão.
Comumente, em círculos de ativistas, ‘regeneração’ é tratada como
‘gentrificação patrocinada pelo Estado’. A explosão do preço das propriedades
na cidade Olímpica/Stratford, no leste de Londres, parece ser um exemplo de
ambas as coisas”, afirmou ao Opera Mundi a pesquisadora Carolyn Smith,
colaboradora do Games Monitor.
Carolyn
dá como exemplo documento elaborado pela Subprefeitura de Hackney, que
administra os distritos mais afetados pelos Jogos. Intitulado “Convergence
Strategic Regeneration Framework” (Modelo de Regeneração e Convergência
Estratégica), ele impõe uma política que estimula a “mistura social” para
nivelar as oportunidades na capital britânica.
“O
documento essencialmente ignora a situação da população do leste de Londres –
ele nos trata como um grupo problemático, dependente de auxílio-desemprego,
aluguel social, salários baixos e que se mudam demais”, disse a pesquisadora,
avessa à “tecnocracia perniciosa”. “Há nesse caso um privilégio de classe
bastante definido, uma preferência por classes mais ricas e uma falta de
comprometimento em diminuir as verdadeiras polarizações sociais.”
O
leste de Londres é recipiente de ondas de imigrações desde o século 17. Já se
estabeleceram ali franceses huguenotes, irlandeses, judeus e, desde a década de
1960, tornou-se lar para migrantes de Bangladesh. O distrito de Tower Hamlets e
Newham, no sudeste, é lar para a maior comunidade muçulmana da capital
britânica. Eles são os principais afetados pela construção do Parque Olímpico.
“As
pessoas são informadas sobre as mudanças, e não consultadas para moldá-las.
Governos sob todas as administrações e em todos os níveis parecem ignorar as
críticas sobre suas políticas urbanas. Nesse caso, elas (os moradores do leste
de Londres) foram caladas pela falta de uma organização que lhes desse voz”,
disse Carolyn.
"O
governo mente desde o primeiro dia"
A
irritação com as medidas do governo britânica é evidente em Julian Cheyne.
Ex-morador de um condomínio social, o Clays Lane Peabody Centre, em Stratford,
ele foi despejado e o conjunto, demolido para dar lugar ao Parque Olímpico. O
Clays Lane, construído em 1977 e composto por 57 casas, era conhecido como a
maior co-operativa de moradores do Reino Unido e a segunda maior da Europa.
Todos foram removidos para outras áreas.
Este é o ponto em que funcionava Oficinas Mecânicas e Desmanches |
E agora o local deu lugar à um Centro Aquático |
Para Cheyne, o Rio de Janeiro, palco para os próximos Jogos, em 2016, precisa estar alerta ou “será tarde demais”. “O discurso de que a Olimpíada traz ‘benefícios’ será apresentado como um assunto de importância nacional, atropelando todas outras quaisquer considerações. Infelizmente, é provável que a maioria dos brasileiros aceitem esse argumento e que seja difícil de persuadi-los do contrário. Isso até o momento em que as pessoas vejam o que realmente está acontecendo e passem pela grande dor de cabeça que é a Olimpíada”.
Fonte: http://nosdiasdenoe.blogspot.com.br/2012/06/as-vesperas-dos-jogos-londres-limpa.html e
http://navalbrasil.com/
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